De modo geral, a gente sabe pouco sobre os bastidores e a história dos diversos personagens do esporte, qualquer esporte. Via de regra, a gente só sabe o que acontece durante o jogo. Mas o tempo do jogo, eu diria, constitui tão somente a ponta do iceberg, aquela parte que flutua fora da água.
De vez em quando, fruto da minha atividade como escrevinhador das coisas do futebol, eu tenho a sorte de descobrir algumas dessas histórias. E depois, a medida em que os meus espaços vão surgindo, eu trato de repassá-las aos leitores que costumam correr os olhos pelas mal traçadas da hora.
Por esses dias, a propósito de tudo isso que estou dizendo, eu tive a oportunidade de conhecer a trajetória esportiva do craque e artilheiro do campeonato acreano de futebol profissional deste ano, o meia atacante Ciel, do elenco do Galvez. Uma trajetória cheinha de aspectos peculiares.
Pra começar as peculiaridades, o Ciel só foi descoberto para o mundo da bola aos 23 anos. Com essa idade a maioria dos jogadores de futebol já ostenta uma larga experiência. Os atletas dos dias de hoje, na sua maioria, chegam aos clubes ainda meninos. E vão, aos poucos, galgando degraus.
Com o Ciel foi o contrário. Ele jogava na várzea na Vila Campinas, sua cidade de origem. Depois, mudou para Senador Guiomard (Quinari), cidade onde ele foi morar depois do casamento com a namorada Rosália. Ali, ele continuou na várzea, batendo as suas peladas nos finais de semana.
Foi aí que tudo começou a mudar. O pessoal da Adesg o viu em ação e percebeu que ali estava uma joia rara, sem lenço, documento ou filiação federativa. Eles tinham razão. Ciel entrou no time como lateral-direito, mas logo assumiria sua real posição e se tornaria um jogador pra lá de essencial.
Dez anos depois, o dito cujo já vestiu as camisas de um monte de times do futebol acreano. Cito alguns: Juventus, Atlético, Independência, Galvez, Humaitá, Plácido de Castro… E todos os inícios de ano ele é procurado por dirigentes e técnicos para se integrar a algum elenco emergente (ou não).
Ser descoberto tardiamente, porém, não é a única peculiaridade na vida do Ciel. É que o futebol não é a sua única atividade profissional. O futebol não chega a ser nem a sua principal atividade profissional. O futebol é um “bico”. O que ele faz sempre mesmo é trabalhar num frigorífico.
Conversei com o Ciel na semana passada. Vou escrever um perfil dele para publicar na próxima revista da Federação. Fiquei admirado com a sua humildade. Ele me confessou que o seu maior sonho é um dia ser campeão acreano. Disse que já bateu na trave duas vezes. “Um dia eu consigo”, falou.