Ao vir à luz no dia 13 de março de 1945, em Belterra, interior do Pará, o cidadão José Maria Pinheiro dos Santos já trazia nas palmas das mãos o traçado do seu destino: iria ser jogador de futebol, ganhar títulos e maravilhar as plateias de três estados Norte do país (Pará, Rondônia e Acre). O nome é que mudaria. E logo o José Maria passaria a ser conhecido como Escapulário.
O apelido ele ganhou no colégio Dom Bosco, onde cursou o primeiro grau, devido a um amuleto que carregava no pescoço. Ele virou Escapulário para a vida a fora e foi nessa condição de rebatizado por um símbolo que vestiu a sua primeira camisa de um time de futebol: a do São Raimundo, de Santarém, cidade para onde a família migrou na década de 1950.
Entre 1960 e 1964, Escapulário defendeu as cores do São Raimundo, sagrando-se duas vezes campeão municipal. Magrinho, jogando na posição de meia atacante, ele precisava usar de toda a sua habilidade para fugir das sarrafadas dos zagueiros inimigos. Por conta disso, ele costumava ensaiar danças à frente dos adversários. E aí sobreveio um outro apelido: “bailarino”.
Em 1965, Escapulário foi convidado para jogar em Porto Velho. Um dirigente do Ferroviário o viu em ação e achou que ele era perfeito para dar o toque de classe que o time precisava naquele momento. Querendo mesmo mudar de ares, além de ganhar um dinheirinho extra, o craque topou. Ficou três anos em Rondônia, chegando também a vestir a camisa do Moto Clube.
Acre, porto definitivo
A mudança para o Acre, de onde nunca mais sairia, veio em 1968, pelas mãos do empresário e diretor do Independência Adalberto Aragão. Antes de estrear pelo Tricolor de Aço, porém, Escapulário disputou, emprestado, um torneio rápido pelo Vasco da Gama. O Independência não jogaria o referido torneio e então o Vasco se aproveitou da situação.
Nos seis jogos que disputou pelo Vasco da Gama, dirigido pelo professor Almada Brito, Escapulário encheu os olhos de todos os que o viram em ação. Desempenho confirmado logo em seguida, na disputa do campeonato estadual, com a definitiva camisa do Independência. Era o início da lenda de um dos maiores jogadores de meio-campo do futebol acreano.
De 1968 até 1976, Escapulário foi companheiro de craques notáveis do futebol regional. Casos de Agrícola, Chico Alab, Flávio, Bico-Bico, Palheta, Eró, Aldemir Lopes, Jangito, Zé Augusto, Jorge Floresta, Ociraldo, Illimani, Júlio César, Otávio, Deca, Manoel, Rui Macaco, Tonho… Grandes artistas! E sagrou-se campeão estadual três vezes: 1970, 1972 e 1974.
Escapulário pendurou as chuteiras aos 31 anos. Embora ainda jovem, o craque começou a sofrer de constantes problemas musculares. Sabia tudo de bola, mas entendeu que não conseguia mais acompanhar a correria dos atletas que estavam surgindo. Provavelmente, a vida boêmia, já que ele não dispensava uma cervejinha, tenha contribuído para abreviar a sua carreira.
A vida depois da bola
Após pendurar as chuteiras, Escapulário foi trabalhar como funcionário público. O futebol foi quem lhe deu o emprego. Ele trabalhou na Secretaria de Educação do Estado até se aposentar. E passou a ficar mais tempo com a família, iniciada em 1970, ao se casar com a namorada Maria. Da união nasceram os filhos Paulo Edson, Ricardo, Ana Paula e João Paulo.
Nos finais de semana, porque o amor com a bola surgiu na vida dele para ser eterno, durante muitos anos ele frequentou a Pelada do Jumbo, inicialmente no campo da Embrapa. Fundada por ex-atletas, a pelada reunia, entre tantos, gente do estirpe de Tadeu Belém (ex-volante), Neórico (ex-zagueiro) e Valdir Silva (ex-atacante). Pelada regada a churrasco e cerveja!
Fora isso, Escapulário jamais se fez de rogado quando lhe perguntavam alguma coisa da sua passagem pelos campos. Não se furtava a contar detalhes, por exemplo, de como se entendia com o parceiro Bico-Bico, dentro e fora de campo. Ou como o dirigente Adalberto Aragão foi importante na sua vida. Ou como o técnico Té dava show nas suas preleções.
Escapulário desenvolveu táticas para escapar dos zagueiros violentos. Uma, numa época em que não existiam caneleiras, era proteger as canelas finas com pedaços de papelão. Outra era chegar para os adversários e levar na conversa, dizendo que cada um deveria ganhar um lance (Rsrs). O bailarino faleceu no dia 2 de janeiro de 2011, vítima de uma cirrose hepática.
(Texto originalmente publicado em Futebol Acreano em Revista – Edição nº 8 – Dezembro de 2018)