No futebol de mais antigamente, valia fazer qualquer coisa (e mais um pouco) para que um time vencesse os seus oponentes. Valia, por exemplo, dedada na bunda para irritar o adversário, ameaça verbal, entrada no pescoço, soco pelas costas, bicudos nos tornozelos. Enfim, era um vale tudo mesmo.
Eu lembro de vários zagueiros do futebol acreano que batiam mais do que delegado depois de três noites sem dormir. Pra eles, não tinha essa de cercar o atacante. Também não tinha essa de amizade. Da pontinha do cabelo até a unha do dedão do pé esquerdo, o resumo de tudo era a canela.
O zagueiro Bararu (pai do lateral esquerdo Duda, esse um cracaço de bola) era um dessas criaturas temidas pela volúpia com que disputava cada bola dividida. O homem era um trator de esteira, jogando a bola para um lado e o adversário para o outro. Um senhor xerife nas décadas de 1950 e 1960.
O Bararu era tão carniceiro que muitos atacantes evitavam ir pra cima dele. Dar as costas pra ele, então, nem pensar. Um dia desses, quem me contou isso com todas as letras foi o ex-jogador e ex-treinador Elden Paiva, o Fuzarca. Ele disse que corria as léguas com medo do zagueiro Bararu.
Outros que me vem à lembrança como exemplos de zagueiros do futebol acreano que botavam moral na suas respectivas áreas são o Lécio, o Iracélio, o Zenon, o Oliveira e o Stélio. Com esses todos, até a bola se rendia humilhada. O lema deles era que o “futebol era esporte de macho”. Só isso.
O Lécio, embora sem muita técnica, todo início de ano era disputado pelos times mais tradicionais. Mas não, necessariamente, por conta da bola que jogava. Os caras o contratavam para não ter que submeter os seus atacantes às travas das chuteiras dele. Menos trabalho para os médicos!
O Iracélio, que fez carreira no Vasco, dava mais tapas nas cabeças do que roubava bolas dos atacantes. Ficou célebre uma expulsão dele depois de ter nocauteado o atacante Gil com um soco. E apesar de todo mundo ter visto a porrada, ele ainda saiu de campo se dizendo perseguido pela arbitragem.
O Oliveira, só para se ter uma ideia do tamanho da encrenca que era enfrentá-lo, tinha o apelido de “Puxa Faca”. O Zenon, sua principal característica era uma “tesoura voadora” na cintura dos “inimigos”. E o Stélio era um lateral tão temido que fazia os ponteiros virarem “armadores”.
Eu fico pensando em como é que esses caras jogariam nos dias de hoje, com o advento do VAR. Ou jogariam de forma mais suave (caso em que os atacantes perderiam o respeito), ou viveriam sendo expulsos. Bendito o VAR para os mais habilidosos. Uma praga de urubu para os xerifes das antigas!