Na temporada de 2008, o Palhaço Rufino na entrada do antigo Maracanã. Foto/Acervo do Palhaço Rufino.

Rogério Barcellos – O goleiro que trocou a baliza pelo nariz de palhaço

MANOEL FAÇANHA

Início dos anos de 1980. O então adolescente Rogério Barcellos Ferraz, filho de pai militar e nascido na Tijuca – RJ passou a se interessar bem mais pelo futebol. Com pouca habilidade nos pés, mas com o sonho de virar jogador de futebol correndo nas veias, Barcellos não pensou duas vezes em optar pela posição de goleiro.

Os anos se passaram e o sonho de ganhar o pão como jogador de futebol foi, aos poucos, sendo trocado pela vida de palhaço. O nome de batismo então passou a atender pelo codinome de Palhaço Rufino (Rogério Curtura) e o maior sucesso na vida artística ocorreu justamente no maior templo do futebol brasileiro, o estádio Maracanã, quando ele interpretou nas arquibancadas o palhaço alvinegro do “chororô”, quando da disputa do Campeonato Carioca de 2008.

Fiel torcedor do Botafogo (RJ) e fã incondicional do goleiro Paulo Sérgio, Rogério Barcellos, 53 anos (ele nasceu dia 9 de agosto de 1966), após longos anos vivendo no Acre, passou a morar desde 2014, com a família, na cidade de Cabo Frio, Região dos Lagos, no estado do Rio de Janeiro, onde ganha o pão se dedicando a arte de fazer as pessoas sorrirem. Neste período de pandemia, porém, com o advento do distanciamento social, está trabalhando como entregador de aplicativo.

Vida de goleiro e transferência para o Acre

Os primeiros passos na carreira futebolística ocorreram na equipe infantil do Fonseca e, posteriormente, no time do Bairro Chique.  Rogério Barcellos e outros amigos, então, resolveram buscar outros ares na carreira futebolística ao participarem de uma peneira na base do Vasco da Gama sob o comando do técnico Mário Tilico (o original). A experiência durou um ano e ele chegou a treinar e realizar jogos amistosos na base do Vasco da Gama-RJ, mas a transferência do pai para a cidade de Juiz de Fora – MG, colocou ponto final no “casamento” com o Vasco da Gama. “Foi uma experiência maneira essa minha passagem pela base do Vasco. Lembro-me que, nesta época, o Zagallo era o treinador e o Mazaropi o goleiro do time principal de São Januário” recordou Rogério Rufino, confidenciando ainda que muitas vezes matou aulas às escondidas dos pais para treinar no Gigante da Colina.

No início dos anos de 1990, o já Palhaço Rufino (E) em atividade na Campanha Salarial dos Bancários do Acre. Foto/Acervo Manoel Façanha

 

Mas a vida de goleiro de Rogério Rufino ainda teve outras experiências. Na cidade de Juiz de Fora, interior de Minas Gerais, para onde o pai havia sido transferido, Rufino passou a fazer parte da equipe de futebol do Tupynambás, mas ficou pouco tempo, pois o clube não apresentava boa infraestrutura. Uma semana depois, a convite de um amigo de sala de aula, ele resolveu assistir um jogo amistoso da equipe do Bom Pastor. Um dos goleiros faltou e veio o convite para ele participar do amistoso. “Não refutei o convite e fiz boas defesas e já fui chamado pra fazer parte daquele time de futsal”, lembra Rufino.

A última experiência de Rufino, como atleta, ocorreu numa competição interbancária de futsal, ocorrida na temporada de 1985, quando já morava no Acre e trabalhava no Bradesco. “Eu e o Fagundes, esse já com experiência no futebol acreano, éramos os goleiros do Bradesco naquela competição organizada pela então Associação dos Bancários do Acre.

 

Rogério Rufino, um amigo e o filho Rogerinho em dia do jogo do Botafogo-RJ. Foto/Acervo Rogério Rufino.

 

A paixão pelo Botafogo e a história do chororô

A minha paixão pelo Botafogo foi influenciada pelo meu saudoso tio Stanley. Ele era um cara maneiro e sempre contava histórias espetaculares do Glorioso, onde citava nomes de jogadores lendários do clube como Garrincha, Nilton Santos, Paulo César Caju, entre outros.

Mesmo morando bastante tempo no Acre, a paixão pelo Botafogo se manteve acesa na vida de Rogério. No entanto, ele e a família tinham planos de passar uma temporada no Rio de Janeiro, mas a esposa Françoise Pessoa, ao passar no vestibular para estudar teatro, desistiu da ideia. No entanto, Rogério e o filho Rogerinho (o Microbinho), não. “Lembro-me como fosse hoje. Eu e o Rogerinho pegamos nossa Brasília, da cor azul, e se tacamos para o Rio de Janeiro. Foram 20 dias de viagem entre shows, paradas para descanso e visitas aos amigos”.

Os artistas das arquibancadas se confraternizam momentos antes do jogo. Foto/Acervo Palhaço Rufino

 

Na Cidade Maravilhosa, Rufino e o filho Rogerinho resolveram prestigiar o Glorioso. O time alvinegro vivia boa fase, mas a eliminação na Copa Sul-americana para o Estudiantes – ARG – e a derrota no Carioca para o Flamengo por 2 a 1, resultado contestado pelo clube alvinegro, que alegava, na época, ter sido prejudicado pela arbitragem – um “pênalti Mandrake” a favor do rubro-negro, trouxe instabilidade geral ao clube, tanto que o presidente Bebeto de Freitas, inclusive, ameaçou chutar o balde. E, pra completar aquela situação, numa coletiva de imprensa, o volante Túlio, o técnico Cuca e o então presidente Bebeto falaram com indignação do lance do polêmico pênalti a favor do gol do Flamengo. Túlio e Bebeto eram os mais emotivos, sendo que o primeiro, chegou a lagrimar.

No meio de semana, após o polêmico jogo contra o Botafogo, o Flamengo recebeu o Cienciano-PER, pela Libertadores. O atacante Souza, após marcar um dos gols da vitória do Flamengo, fez o gesto de choro provocativo aos alvinegros que ficou conhecido como chororô. “Foi algo irritante para nós torcedores do Botafogo, principalmente na estrofe que cantava ninguém cala esse chororô”.

Com a guerra declarada, o Rufino, com formação no curso de Educação Física da Ufac, falou para o filho Rogerinho (Microbinho): temos que pensar alguma coisa para virar esse jogo. Os dias se passaram e as duas equipes tiveram outra batalha pelo certame Carioca, mas agora, valendo vaga na decisão da Taça Rio. Rufino e Rogerinho se prepararam para o jogo. Pintados e vestidos de palhaços, foram ao Maracanã com objetivo de zoar o atacante rubro-negro Souza. “Lembro-me que estávamos nas cadeiras azuis (antigas gerais) e quando o Souza pegava na bola não faltavam adjetivos maneiros. Rss…Rapidamente a torcida do Botafogo comprou a briga e não era mais apenas duas vozes zoando o atacante flamenguista, mas milhares. Os holofotes da imprensa já miravam na gente e, quando eu apertava o rabo do Urubu Chorão, era choro e água pra todo lado”, lembra às gargalhadas Rufino.

Os palhaços Rogério Rufino e Rogerinho tiram sarro e fingem chororô, mas de alegria. Foto/Acervo Rogério Rufino
Fac símile do Jornal O Dia retrata o espetáculo das torcidas de Botafogo e Flamengo.
Fac símile do Jornal O Dia retrata a gozação do Palhaço Rufino sobre o torcedor flamenguista
Fac símile do jornal O Lance mostra a irreverência dos palhaços Rogério e Rogerinho

Com o troco dado – vitória do alvinegro por 3 a 0, o Botafogo ainda venceria o Fluminense (3 a 1) e conquistaria a Taça Rio daquele ano, voltando assim a encarar o Flamengo em dois jogos decisivos pelo título do Carioca, ambos vencidos pelo time rubro-negro.

Outro episódio marcante e a elitização do torcedor de arquibancada

Outro episódio marcante na vida de torcedor/palhaço, segundo Rogério, foi à vitória do Botafogo na estreia do Campeonato Brasileiro deste mesmo ano, quando o time venceu o Sport-PE por 1 a 0, gol do baixinho Jorge Henrique, em partida realizada no estádio Engenhão. “Eu lembro que, dias antes, o Flamengo, em pleno Maracanã, havia levado um chocolate do América – MEX por 3 a 0, com três gols de Cabañas. Então, eu chamei o Rogerinho, coloquei um chapelão mexicano nele e ainda dei uma guitarra pra ele e fomos para o Engenhão. Lá, o Rogerinho (fantasiado de Cabañas) cantava em espanhol: cuánta la mierda oye, Maria, o Souza é una mierda, Obina é una mierda, Flamengo todo é una mierda…”, relembra sorridente do fato o Palhaço Rufino.

Também neste dia, segundo Rufino, enquanto o Rogerinho cantarolava em espanhol o urubu chorava. “Foi uma tiração de onda maneira também neste dia, tanto que a galera do Fogão, ao sair do Engenhão, cantarolava a música do Cabañas”.

Sobre a realidade atual do torcedor de arquibancada no país, o Palhaço Rufino explica que o fim da geral no estádio Maracanã, seguindo o modelo de arenas que foram instituídas na maioria das grandes praças esportivas do país, a partir da Copa do Mundo de 2014, foi bastante maléfica ao torcedor de baixa renda. “Esse novo modelo de estádio, com ingressos caríssimos e menor capacidade de público, serviu, de uma forma ou de outra, para expulsar o povão das arquibancadas e com ele uma parte das manifestações culturais existentes em nosso país. Se no gramado já não existem tantos craques, nas arquibancadas essa realidade não é tão diferente, pois nossos torcedores folclóricos estão em extinção ou forçados a acompanhar o futebol somente do televisor de casa”.

 

Rogerinho, fantasiado de mexicano, ao lado pai Rogério Rufino, em jogo do Botafogo no Engenhão. Foto/Acervo Rogério Rufino
Fac símile da página de Esportes do Jornal Opinião de 26 de julho/2020.

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