Gosto de andar pelo mundo. Acho que a melhor maneira para aprender sobre a cultura e os costumes de outros povos é vivenciá-los in loco, ao vivo e em cores. A pandemia, entretanto, deu uma travada nesse meu exercício. Já faz dois anos que eu não arredo o pé do espaço territorial brasileiro.
A respeito de costumes, uma das coisas que eu observei, desde a primeira viagem internacional, foi que a refeição matinal da maioria das pessoas é um almoço (os portugueses até chamam mesmo de “pequeno almoço”). Bem diferente da nossa, à base de pão, manteiga e café com leite.
No Panamá, onde estive em julho de 2010, me surpreendi quando vi na mesa ao lado da minha, antes das sete horas da manhã, uma família de pai, mãe e dois filhos pequenos se deliciando com um prato de feijão preto, misturado com pedaços de porco defumado, arroz branco e banana cozida.
Já na Espanha, tanto em Madrid quanto em Barcelona, Sevilha ou Cádiz, as cidades por onde passei nas duas vezes em que estive no citado país, o que os caras mais comiam cedo era paella. Generosos pratos de arroz colorido por açafrão, preparados com suculentos frutos derivados do mar.
Foi pensando nesse costume dos gringos, que eu resolvi alterar o meu café da manhã desse sábado de agosto, substituindo o pão francês por uma paella com muito camarão. Decidi isso como forma de comemorar a vitória do Brasil contra a Espanha, na final do ouro olímpico do futebol masculino.
Por via das dúvidas, que esse jogo de bola jamais foi (ou será) uma ciência exata, onde vencem os melhores, decidi comer a paella apenas ao final do confronto. Eu diria, por isso, que os meus olhos, durante a partida, ficaram se movendo entre a travessa com a iguaria e a tela do televisor.
Eis que o Brasil fez um gol, no final do primeiro tempo. Abriu o placar com o ótimo centroavante Matheus Cunha. E eu passei a ver a paella com olhos de ardente paixão. Visão que, naturalmente, se transformou em alguma desconfiança quando os violentos súditos do rei Filipe VI empataram o jogo.
Mas esse é um esporte de idas e vindas, de ventos que mudam de direção assim sem mais ou menos. Veio a prorrogação e um negro veloz de nome Malcom, atualmente exilado nas estepes russas (ele é jogador do Zenit de São Petersburgo) liquidou a fatura. Brasil bicampeão olímpico, 2 a 1.
Pude então comer a paella com raro prazer. A Espanha que me aguarde para um retorno tão logo se abram as fronteiras depois da pandemia. E nessa próxima vez, já aviso logo, descerei do avião recitando o poeta García Lorca, “mais distante que todas as estrelas e mais dolente que a mansa chuva.”