Estou convencido de que a bola, aquele objeto de desejo de 22 criaturas que se digladiam numa partida de futebol, tem vontade própria. No dia em que ela resolve não passar pela linha fatal que determina a entrada no gol dos adversários, não tem jeito. Não tem reza de padre velho!
Nos dois primeiros jogos da seleção brasileira de futebol masculino nos Jogos Olímpicos de 2016 a bola fez da birra a sua profissão de fé. Entendeu que deveria humilhar os torcedores que foram ao Estádio Mané Garrincha, em Brasília. Humilhar os torcedores e, naturalmente, os craques.
Talvez a ideia não fosse nem, necessariamente, humilhar os torcedores e os craques. Pode ser que a bola estivesse em cruzada contra a corrupção e a bandalheira toda que permeia tanto os subterrâneos quanto os ares da capital federal. E assim, foram dois zero a zero pra lá de frustrantes.
Nesse sentido, creio que não se pode duvidar que a seleção a essa hora estivesse desclassificada se o terceiro jogo tivesse sido marcado para Brasília. O clima é pesado. O desenho da cidade, que sempre foi o de um avião, hoje está mais para o de uma cruz, objeto fatal de suplício e dor.
Foi só o jogo mudar de endereço, porém, para a senhora bola fazer as pazes com os pés dos rapazes do Brasil. No Estádio da Fonte Nova, em Salvador, Bahia de todos os santos e deuses, a alegria voltou. A Dinamarca nem viu o trem que a atropelou. Foram quatro gols e poderia ter sido mais.
O curioso é que os torcedores baianos previram o fato. Nas muitas reportagens das diversas emissoras de televisão que estão cobrindo os Jogos Olímpicos 2016, vários entrevistados declararam que a seca de gols iria acabar. Os eflúvios da Bahia animam sim a bola da seleção do Brasil.
Se toda essa minha argumentação tiver um mínimo de razão, cabe à Confederação Brasileira de Futebol, numa medida de agrado à divindade bola, tomar duas decisões. Primeira: jamais marcar um jogo do Brasil para a capital da República. Segunda: marcar os próximos jogos para a Bahia.
Não é por acaso que se diz que a Bahia é a terra de todos os santos. Não é por acaso também que se diz que as bruxas estão soltas em Brasília. Está mais do que provado que a bola gosta de transitar no Olimpo, se exibir para os deuses, mostrar-lhes a sua graça e a sua leveza, farra de alegria!
A bola tem vontade própria sim. E gosta de ser tratada com carinho. Ela não gosta, de forma alguma, de falcatruas, podres poderes, negociatas escusas ou dólares transportados em cuecas. A bola gosta de arte e devoção. A bola gosta do toque que transforma uma curva em gozo eterno!