Janeiro de 1986 estava com a minha mãe no Center Um, pequeno shopping Center localizado no bairro da Aldeota na capital alencarina (Fortaleza), quando me encontrei com meu tio avô, Walter Sátiro. Dono de um sorriso encantador e um conquistador inveterado, ele se dirigiu a mim, um mirrado adolescente, e falou: “estava te procurando, ia até ligar para sua mãe. Tenho o livro de um amigo meu que quero lhe dar.” Confesso que não consegui acreditar que alguém poderia me presentear com um livro, mas ele logo completou de forma ainda mais entusiasmada: “este meu amigo sabe tudo sobre futebol e o livro dele fala sobre todas as Copas do Mundo.” Pois é, ao falar futebol, ele ligou os meus olhos.
Saímos de lá e fomos até a sua casa pegar o livro “Seleção das Seleções” de Aírton Silveira Fontenele. Uma obra que consumiu boa parte das minhas férias e que me fez fã daquele senhor, que jamais ousara a conhecer. Sabia, por exemplo, que anos antes, coubera a ele corrigir a CBF sobre o número de jogos do campeão mundial Jairzinho. Sob o argumento de promover sua centésima partida com a camisa canarinha, o atacante foi convocado por Telê Santana para o amistoso da seleção brasileira diante a Tchecoslováquia, em 3 de março de 1982, no estádio do Morumbi, empatado em 1 a 1. Não demorou muito para que, de forma cirúrgica, Seo Airton identificasse o equívoco nos cálculos oficiais. Virou notícia em vários jornais pelo Brasil, destaque na revista Placar e ganhou, desde então, a amizade de João Havelange, o então manda chuva da FIFA. Por conta disso, sempre o tive em meus sonhos. O quão genial seria aquele homem?
Anos depois, já em 2002, fui presenteado com uma ligação sua, me convidando para visitar a sala João Saldanha, um verdadeiro tesouro para qualquer fã do esporte bretão. Fui ao seu encontro. O tamanho daquele sorriso me tornou ainda mais seu fã. A atenção com que me apresentou todo seu acervo e a forma cuidadosa com que fazia questão com que me sentisse como se estivesse em minha própria casa, me remeteu ao longo sorriso do meu tio avô, já falecido, e todo o seu entusiasmo. Ao final da visita, fez questão que eu autografasse uma tela ao lado de grandes astros do futebol mundial que já visitaram aquele espaço. Assustei-me com este pedido e perguntei para ele: “Seo Airton, quem sou para assinar junto com tantos astros”. De imediato, ele me desarmou respondendo “Você é meu amigo”. Não poderia ser mais doce.
Sempre atento, sua dedicação a história da seleção brasileira é algo único jamais encontrado em quaisquer dos maiores apaixonados pelo nosso futebol. Certa vez, me confidenciou a forma artesanal como mantém seus dados sempre atualizados e corretos. Algo incrível. Tenho a felicidade de ter todos os seus livros em meu acervo, alguns deles valiosos por seu autógrafo, mas o mais importante dele está em meu coração, a certeza de poder contar com sua amizade, apesar da distância e de tantos obstáculos que ela acabe por provocar.
Como diria nosso amigo saudoso, em comum, Cristiano Santos, “Parabéns Airton Fontenele do Brasil”.