Caminhos e descaminhos

Caminho por Copacabana por estes tempos. Depois de umas semanas na Barra da Tijuca e outras tantas no Catete, escolhi a rua Barata Ribeiro para armar a minha barraca. Escolhi bem. Tem de tudo em volta da minha morada. É só descer do prédio e caminhar alguns passos que tudo está à mão.

É verdade que o bairro anda maltratado, meio que abandonado pelo poder público, com calçadas que já viram dias melhores e com muitos sem teto estendidos sob as marquises quando a noite cai. E que cachorros mal-educados despejam dejetos onde lhes dá na telha, sob a indiferença dos donos

Mas nada que possa fazer alguém abominar o lugar. Um charme antigo ainda se espalha pelo ar. Aliás, em contraponto com tudo que não agrada ao olfato ou à visão, ainda existem muitas moças balançando o corpo, dentro de sumários biquínis, em busca de um destino que chega nas ondas do mar.

A bem da verdade, onde se lê biquínis entenda-se “fios dentais”. Biquíni, como se costuma dizer por aqui, é para as fracas ou para as excessivamente pudicas. Nem uma turista argentina usa mais aquilo que a gente costumava chamar de biquíni. Ser in agora é desfilar de bunda de fora.

São longas as conversas e lânguidos os olhares nas areias que margeiam a Av. Atlântica. Do horizonte chegam águas do continente africano. E estas dizem pra quem quiser ouvir que todo preconceito racial (ou não) é fruto da ignorância. Fechar estradas e discriminar minorias idem.

Pequenos deuses (e deusas) com dragões tatuados no corpo erguem esculturas na areia. Muita gente se detém para tirar uma fotografia. A pose fica armazenada numa nuvem. Já as esculturas, essas se dissolvem na primeira chuva. E como tem chovido aqui no Rio nesses últimos meses!

Por falar nisso (preconceitos, esculturas na areia e deuses), domingo passado enquanto eu percorria a lateral de uma praça na Av. Nossa Senhora de Copacabana, um som peculiar dos irmãos nordestinos chamou a minha atenção. Me aproximei e vi uma dezena de sanfoneiros em plena atividade.

Tratei de “curiosar” e fiquei sabendo que o grupo se denominava “Orquestra Sanfônica”. Um homem de semblante solene, do tipo que a gente reconhece só de olhar como oriundo do Ceará, chorava em silêncio, talvez de saudade, talvez com orgulho por ter ajudado a mudar os rumos do país.

Depois de alguns minutos, retomei os meus passos. Os sons das sanfonas me seguiram por um tempo. E nessas de caminhar e ouvir, não pude deixar de lembrar de uma frase que eu li numa crônica do Rubem Braga: a de que “a esperança sobrevive à custa de mutilações”. Que venha o hexa!