Em princípio, por uma questão de lógica, o futebol é um esporte para quem goza completamente do respectivo sistema sensorial. Ou seja, para os indivíduos que conseguem captar plenamente, através dos seus órgãos receptores, os estímulos que se multiplicam em volta do próprio corpo.
Os principais órgãos do sistema sensorial são pele, língua, nariz, ouvidos e olhos. Esses órgãos captam estímulos físicos e/ou químicos e os transformam em impulsos elétricos, que são transmitidos ao sistema nervoso central. As reações de cada indivíduo dependem dessa alquimia.
Naturalmente, em se tratando de futebol, alguns desses sentidos são mais ou menos importantes. A língua, como só se pode “comer a bola” em sentido figurado, não é tão importante assim. Da mesma forma, não sendo necessário cheirar nada, o nariz também não tem essa importância toda.
Por outro lado, ouvir e ver são sentidos tidos e havidos como absolutamente importantes para todos os que de alguma forma estejam envolvidos com o chamado “esporte bretão”. É preciso estar sempre, dizem os especialistas, com os ouvidos e os olhos bem abertos. O som e a luz!
O futebol, porém, é um esporte que adora contrariar a lógica e o senso comum. Não fosse assim, seria outro jogo. Tanto que de vez em quando surge um “surdinho” ou um “ceguinho” fazendo mágicas com a bola ou perpetrando análises e maravilhas literárias sobre o referido tema.
De cegos, então, eu diria que a história do futebol brasileiro está cheia até a tampa. Dois dos mais famosos dessa galeria me ocorrem enquanto escrevo: Nelson Rodrigues, cronista carioca, irmão de Mário Filho (nome que batizou o Maracanã), e o insuperável rei Pelé. Só isso!
Do Nelson Rodrigues, reconhecido, do ponto de vista da produção de crônicas esportivas, como um dos dois maiores de todos os tempos (o outro seria Armando Nogueira), diz-se que ele era tão deficiente do sentido da visão que só via vultos no campo. E, no entanto, era um craque do texto!
No tocante a Pelé, reza a lenda que o “negão” quase foi cortado da seleção brasileira que foi tricampeã no México por conta de uma acentuada miopia. Pois bem. Para nossa sorte, alguém (seja lá quem tenha sido) resolveu bancar a presença dele no grupo. E aí, todo mundo sabe o resto!
Por tudo isso é que eu quero defender aqui o Afonso Alves, técnico do Amax, clube do futebol acreano, que não viu um dos seus atletas ser expulso, domingo passado, na derrota do time para o Atlético. Se até o Nelson Rodrigues e o Pelé eram cegos, por que o Afonso não pode ser?