Céu cinzento

Tive um pressentimento ruim logo na manhã de domingo, quando saí do hotel em que me hospedo por esses dias em São Paulo. É que ao olhar para o céu não vi nem um pedacinho de azul. Ao contrário disso, nuvens espessas pairavam sobre as cabeças dos transeuntes. Espessas e cinzas.

O meu pressentimento ruim tinha a ver com o jogo da tarde entre Atlético Acreano e Moto Clube, do Maranhão, em Rio Branco, decidindo uma vaga para a série C do próximo ano. É que, ao olhar para o céu eu procurava a cor azul da camisa do Galo. Procurei, mas não havia o azul.

Depois de alguns minutos, já em plena Avenida Paulista, correndo para me abrigar sob o vão do Museu de Arte de São Paulo (MASP) de uns pingos de chuva que ameaçavam cair, eu tratei de afastar os maus presságios. Afinal de contas, não poderia ter a ver uma coisa com a outra.

A razão cochichou aos meus ouvidos que o céu de um lugar não tem nada a ver com o céu de outro. O céu do Acre poderia até estar de pleno azul naquele mesmo momento. E aí sim, se de fato estivesse azul sobre as cabeças dos interessados no jogo, isso é que contaria para o real desfecho.

A movimentação da Avenida Paulista aos domingos, com o trânsito fechado para os automóveis, e as performances dos inúmeros artistas de rua, acabou por distrair os meus sentidos. E o mau presságio se esvaiu no espaço. Grudei os pés no chão e me incorporei à paisagem a minha volta.

Incorporar-se à paisagem da Avenida Paulista num domingo significa deixar entrar por todos os poros do corpo a multiplicidade de sons que emanam de todos os lugares: da flauta que encanta uma serpente imaginária à sanfona que convida para um forró sobre o negror do asfalto.

Não bastassem todos os elementos de distração, ainda sobreveio na sequência um almoço extraordinário num restaurante mineiro em uma das muitas ruas nas imediações da Avenida Paulista. Um almoço regado a uma irresistível cachaça de alambique. Não há pressentimento ruim que resista.

De qualquer forma, ao contrário do que sempre faço, dessa vez eu não quis ficar acompanhando o jogo pela internet. Preferi me concentrar na manifestação popular contra o recém-empossado Michel Temer. Voltei para a Avenida Paulista e por alguns minutos me senti parte da história.

Já era quase meia-noite quando voltei para o hotel. Em princípio nem acreditei quando vi que o Atlético havia perdido. O time de melhor campanha estava fora de combate. Lembrei o pressentimento ruim da manhã. O céu deveria ser sempre azul. A camisa do Galo é sempre azul!