Reveja a entrevista do capitão Zé Marco após eliminação para o Asa-AL, em 2009

O capitão Zé Marco diz que faltou mais coração

O jogador de 28 anos está desempregado e vive das economias, mas pode ser reforço do Clube do Remo na próxima temporada.

MANOEL FAÇANHA

Ainda abatido e buscando forças para encarar a eliminação do Estrelão na disputa do Campeonato Brasileiro da Série C, o capitão Zé Marco resolveu falar à reportagem de O Rio Branco. O jogador de 28 anos está desempregado e vive das economias, mas pode ser reforço do Clube do Remo na próxima temporada, apesar de declarar que a prioridade seria a permanência na equipe acreana.

Na entrevista, Zé Marco fala de planejamento, da discussão nos vestiários com o lateral direito Ley e do comportamento do meia Testinha na concentração. O capitão ainda agradece à torcida e elogia o presidente Natal Xavier pelo empenho de tentar levar o Estrelão à Série B.

Por fim, o volante acredita que um time competitivo é a receita para a diretoria e investidores ganharem novamente a confiança do torcedor acreano.

Setor de defesa do Asa de Arapiraca corta mais uma investida do ataque estrelado no jogo decisivo da Série C de 2009. Foto/Manoel Façanha.

O RIO BRANCO – Zé Marco, como você avalia a perda do Estadual, assim como da tão sonhada vaga no Campeonato Brasileiro da Série B?

ZÉ MARCO – Olha, Façanha, avalio com muita tristeza. Todos os anos quando se monta o time, cria-se uma expectativa muito grande. Os torcedores e a crônica sempre apontam o Rio Branco com o favorito, muito deles dão o título antes mesmo da bola rolar, não nós jogadores que preferimos trabalhar com respeito aos demais adversários, que preferimos trabalhar com respeito aos demais adversários.

Quanto à raiz da pergunta quero dizer que sempre é complicado falar do assunto. Porém, avalio que durante a disputa do Estadual, por questões da ausência de torcida, mídia e desorganização de alguns clubes ocasionou um relaxamento de nossa equipe, não menosprezo.

Em relação à série C é preciso dividir responsabilidades. Chegamos ao último jogo numa circunstância muito favorável, mas acabamos vacilando e perdendo a vaga em pleno estádio Arena da Floresta, com 14 mil torcedores a nosso favor. Se houve culpado nesta partida, a culpa maior cai para nós jogadores. No entanto, antes disso acho que houve falha no sentido de um melhor planejamento, pois a menos de duas semanas da estreia ainda não tínhamos um grupo completo, mas graças ao trabalho de todos superamos tudo isso e chegamos à última rodada com chances de subir à Série B.

ORB – Quando a bola rolou o que você observou?

ZÉ MARCO – Observei que o semblante dos jogadores do Asa tinha mais sangue no olho, como diz o ditado. O time entrou com uma pegada forte e superior à nossa. Então acredito que faltou um pouquinho mais disso ao Rio Branco, no sentido de ter a noção da importância do jogo para o tão sonhado acesso a disputa de uma série B, onde um triunfo nosso faria história no futebol local. Ou seja, acredito também que faltou corrermos mais, dividir, brigar, xingar, fazer o que era para ser feito pois era uma oportunidade única que ninguém sabe quando teremos outra pela frente.

O Asa-AL jogou com personalidade e esbanjou um futebol aguerrido para arrancar o acesso dentro da Arena da Floresta. Foto/Manoel Façanha.

ORB – Como você analisa o grupo de jogadores deste ano?

ZÉ MARCO – Olha, se a gente pega o elenco do ano passado e compara com o deste ano chegamos à conclusão que o grupo anterior era bem melhor, não que esse não fosse bom. Então é preciso pensar um pouquinho mais antes de formar o elenco, pois existe muita coisa importante envolvida e o clube tem muito a lucrar, assim como a cidade o estado. Acho que tem que haver essa união no geral para não cairmos em novo pecado.

Quero dizer com isso que nossa eliminação trouxe prejuízo para todos e muitos estão pagando o preço dessa eliminação, pois o nosso calendário é curto e os jogadores são os primeiros a contabilizar os prejuízos.

ORB – Na saída do estádio um grupo de torcedores chegou a chamar o grupo de pipoqueiros… pipoqueiros… pipoqueiros…

Rio Branco – 2009. Em pé, da esquerda para a direita: Douglas, Régis, Ismael, Rodrigão, Josa e Dorielson Mendes (prep. de goleiros). Agachados: Ley, Ananias, Rodrigo Paulista, Babá, Zé Marco e Neném. Foto/Acervo Sebastião Carvalho

ZÉ MARCO – Olha, Façanha, o torcedor é movido por paixões. No início da competição ninguém acreditava na nossa equipe, mas durante o desenrolar fomos conquistando o coração de cada torcedor e no dia do jogo decisivo o estádio estava cheio, apesar de alguns ainda carregarem a desconfiança das duas últimas eliminações.
A respeito do adjetivo pipoqueiro quero dizer que o torcedor tem esse direito de falar, de cobrar, assim como de xingar, pois ele pagou o ingresso. Nós questionamos apenas aqueles que vão aos coletivos do dia a dia para ficar perturbando. Mas no estádio, o torcedor tem o direito de fazer a sua crítica.
Outra coisa. Se analisarmos a situação de 2007, aonde chegamos pertinho do octogonal e deixamos o resultado escapar e agora ficamos a um empate da vaga é natural a frustração do torcedor, imprensa e jogadores. Ou seja, isso tudo provocou a reação de uma parte do torcedor.

Falando de torcida quero abrir um parágrafo para agradece a organizada Pano Branco. Por que a Pano Branco? Porque eles nos apoiaram após as derrotas para o Sampaio e o Luverdense e ainda foram nos buscar no aeroporto com bandeira, cartaz, charangas e aplausos. Outra atitude de carinho dada pela torcida foi quando fomos recepcionados no aeroporto na chegada de Arapiraca. Portanto, a Pano Branco é uma organizada que vem crescendo e ajudando muito o Rio Branco. Eu não sei meu futuro, mas agradeço a toda nação acreana, assim como a torcida Pano Branco pelo carinho.

ORB – O que tirar de proveito dessa eliminação?

ZÉ MARCO – Nós jogadores temos que amadurecer com isso. O ser humano amadurece muito com os erros. Lógico que a gente espera que isso seja a última vez, mas sabemos que no futebol não tem a última vez, pode acontecer novamente. Como conselho fica a lição de nos programar um pouco melhor. Quero deixar claro que o Rio Branco FC está no caminho certo, assim como o presidente Natal Xavier, pois ele e sua diretoria têm buscado reestruturar o clube da melhor maneira. E, exemplo disso é o novo vestiário e as condições dadas pelo clube durante as viagem para jogos fora de casa. Ou seja, a mentalidade no clube tem mudado ao longo dos anos. Assim acredito que a vaga na série B continua muito perto.

Rio Branco – 2009. Em pé, da esquerda para a direita: Venícius Martins (prep. físico), André, Rodrigo Goiano, Gledson, Ismael, Josa, Rodrigão, Jean, Régis, Douglas e Dorielson Mendes (prep. de goleiros). Agachados: Renatinho, Hendrick, Ley, Rogério Tarauacá, Juliano César, Testinha, Ronaldo, Ananias e Zé Marco. Foto/Manoel Façanha.

ORB – Se você fosse o presidente ou o principal investidor, o que faria para resgatar o torcedor ao estádio Arena da Floresta na próxima edição da Série C?

ZÉ MARCO – No momento é complicado. Acho que o tempo vai cicatrizar essa ferida, não apenas em nós jogadores, mas também na torcida. Quanto ao que fazer para trazer novamente o torcedor é simples: basta fazer um time competitivo. Isso é aqui, em São Paulo, Rio de Janeiro, Paraná, em Minas e no mundo inteiro. Ou seja, se a equipe é competitiva e demonstra condição de brigar pelo acesso, vai levar o torcedor ao estádio. Portanto, entendo que o primeiro passo é o planejamento para formar um grupo competitivo e o presidente Natal Xavier também entende que isso é importante e já começa a trabalhar neste sentido para a próxima temporada, pois o sonho de chegar à Série B não acabou.

ORB – O que aconteceu com o Testinha? E verdade que ele teria adoecido à véspera do jogo como chegou a se comentar nos bastidores? O que realmente ocorreu com ele?

ZÉ MARCO – Veja bem. O Testa é uma pessoa muito reservada. Muito calada, muito na dele. Muito consciente quando abre a boca, quando fala. Na concentração em si, acho que devido o fato dele ser assim, ficar muito na dele, muito calado, não deu para perceber nada de anormal. O certo é que fui ouvir essa conversa de doença do Testinha através do presidente Natal Xavier, isso dias após o jogo. Sinceramente, eu não sei o que falar sobre o assunto, pois não tive mais nenhum contato com o Testinha. A resposta sobre isso só quem pode dar é o Testinha.

Entretanto, eu, particularmente, não participei do jogo de ida, contra o Asa de Arapiraca, assim como o Testa. Neste período conversamos bastante e ele sempre demonstrou muita motivação para o jogo contra os alagoanos, apesar de ter passado quase duas semanas entregue ao Departamento Médico, algo que temos que levar em conta, não pelo fato dele ser um jogador que vinha decidindo jogos a nosso favor, mas também por se tratar de um ser humano atleta.

ORB – O que passou pela sua cabeça após o apito final do árbitro Vagner Tardelli?

ZÉ MARCO – Uma tristeza muito grande. Eu te digo, sombra de dúvida, sem medo de errar: nós que estávamos batalhando há mais tempo por esse acesso, sentimos muito mais que algumas peças que chegaram este ano ao clube.

ORB – Qual foi o clima no vestiário após o jogo?

ZÉ MARCO – Foi de muita tristeza, e choro, não apenas de minha parte, mas de todo o grupo. Chorei, desabafei e cheguei a quebrar algumas coisas [lixeira e garrafas d’água] no vestiário e depois acabei gritando com o Ley a respeito do último lance do jogo [bola parada a frente do gol do Asa, pois tinha aconselhado o Renatinho cobrar a falta, mas o próprio Ley acabou isolando a bola sobre o gol dos alagoanos. Mas fica aqui o registro que dias depois fui à casa do Ley e pedi desculpas pelo episódio e tudo ficou resolvido, pois o Ley é um excepcional ser humano e um grande amigo. Assim, crédito todo esse episódio ao fato de estar com a cabeça quente do jogo. O certo é que criamos uma expectativa de futuro positiva, mas não ocorreu e isso foi muito frustrante para o grupo, principalmente para aqueles que já haviam feito até dívidas por conta de uma possível classificação [não foi o caso de Zé Marco], pois nem o mais pessimista torcedor acreditava no insucesso de nosso grupo naquela partida. Infelizmente, aconteceu, e agora é pedir proteção a Deus. Uma coisa eu te digo, Façanha, nós tínhamos um horizonte muito grande pela frente antes do jogo, mas após o jogo eu, particularmente, não vejo muita perspectiva. Lembro-me que quando cheguei em casa e olhei para o meu filho de um mês, não vi muita perspectiva de futuro e ainda hoje não vejo. Lógico, estou em casa e ansioso por um telefonema para ver se aparece alguma coisa. No entanto, até o momento, estamos vivendo do que conseguimos guardar.

O lateral direito Ley isolou a última bola no jogo na eliminação para o Asa-AL. Foto/Manoel Façanha.

ORB – Como era o clima dos jogadores antes da decisão?

ZÉ MARCO – Eu, como capitão, sempre estava com todo mundo para analisar o clima dos jogadores. Na concentração, no sábado, era de alegria e confiança, mas é natural quando se aproxima a hora do jogo alguns jogadores apresentarem aspecto de nervosíssimo e outros de ansiedade, mas não dá para saber o que passa na mente e no coração de cada jogador. No entanto, se analisarmos fisicamente a expressão de cada jogador, dava para identificar quem estava mais motivado, ansioso e tenso para o duelo, isso numa avaliação minha o que é uma reação natural, pois era um jogo para entrar para a história do futebol local. Agora, paciência, mas agradeço também esse período que tive na agremiação, pois sempre houve um respeito mútuo de ambas as partes, assim como carinho de todos aqueles que fazem o clube.

ORB – Não sobrou confiança após o empate em Arapiraca?

ZÉ MARCO – Existia uma confiança muito grande pelo resultado conquistado em Arapiraca, mas acredito que o pecado foi analisar o time alagoano e achar que ganharíamos aqui, não a forma de como eles viriam jogar no estádio Arena da Floresta. Quero dizer que é muito mais cômodo jogar fechadinho [como o Rio Branco jogou lá] ao invés de buscar o resultado. Então existe uma diferença tática muito grande da partida de lá para a ocorrida aqui.

ORB – Tentativa de invasão do hotel do Asa, por parte de alguns torcedores do Estrelão foi prejudicial?

ZÉ MARCO – Acredito que prejudicados nós não fomos, mas que motivou o adversário é uma realidade, pois a comissão-técnica ganhou argumentos para dizer aos seus jogadores. Porém, acredito que a motivação maior era o fato de o jogo valer uma vaga à série B, assim como uma premiação de R$ 200 mil pela classificação. Em termo de argumento para motivação, nosso time levava vantagem, pois jogávamos diante de nossa torcida [14 mil presentes] e por um empate sem gols para ficarmos com a vaga.

ORB – O esquema de jogo e a escalação foram ideais?

ZÉ MARCO – Isso é bastante relativo. Cada um tem sua visão. Eu tenho um time, você tem outro e assim por diante. O professor Everton tinha o dele e naquela partida escalou quase todos os titulares de costume – exceto o zagueiro Rodrigão [suspenso]. Nossa parte é jogar, mas, infelizmente, tem dia que as coisas não acontecem. Portanto, não posso crucificar o professor Everton Goiano pelo fracasso.

O técnico Everton Goiano beliscou o acesso com o Rio Branco na temporada 2009. Foto/Manoel Façanha.

ORB – Nas últimas três edições de Série C houve uma valorização de nossos jogadores? Fale disso.

ZÉ MARCO – Verdade. Não só no aspecto financeiro. Pode-se observar que durante os três últimos anos houve uma melhor organização em vários aspectos e o torcedor presenciou isso ao comparecer em grande número à maioria dos jogos, assim dando retorno financeiro ao clube. Ou seja, futebol se faz com organização e valorização dos profissionais, algo que outros clubes acreanos poderiam se espelhar na política do Rio Branco para o crescimento de nosso futebol. Em relação a salário, quero dizer que essa valorização deu uma tranquilidade muito grande aos jogadores para trabalharem de forma profissional.

ORB – Como está seu futuro. Existe possibilidade de você continuar no Rio Branco ou se transferir para outra agremiação?

ZÉ MARCO – Meu interesse é pela permanência no Rio Branco, assim contribuindo para continuarmos lutando por uma vaga no Campeonato Brasileiro da Série B. Neste contexto de fica ou sai, ainda tem o lado emocional, pois fiz muitas amizades no clube [diretoria, funcionários e torcedores]. Nestes últimos anos muitas coisas marcaram positivamente na minha carreira no clube e algumas imagens ainda estão na minha cabeça, como de pessoas se abraçando de felicidade e enchendo os olhos de lágrimas naquela vitória ocorrida no apagar das luzes contra o Águia. Ou seja, isso nos deixa muito emocionado e feliz por fazer parte deste clube. Porém, a decisão continuar, fica por conta da diretoria e até hoje não sei se ainda estou nos planos do clube. De certo, houve um contato verbal do técnico do Clube do Remo para saber da possibilidade de uma transferência minha para o futebol paraense, mas isso é somente para o final do próximo mês e muitas coisas podem acontecer.

ORB – Você quer fazer algumas considerações?

ZÉ MARCO – Olha Façanha, a gente tem muito a agradecer ao Rio Branco, assim como ao presidente Natal Xavier, que foi uma pessoa que ao longo desses anos nos ajudou bastante, inclusive ajudando financeiramente a minha pessoa, mesmo sem eu ter contrato com o clube. Isso mais por questão humana e de carinho que ambos temos um pelo outro, algo que me emociona bastante, apesar de saber que sempre fiz o melhor de mim no clube. Também quero agradecer à nação acreana que sempre respeitou o meu futebol [apesar de não ser unanimidade, pois é natural um ou outro fazer crítica] e mais uma vez pedir desculpa pelo fato de não termos conquistado a vaga na Série B.

FRASE

“No último jogo faltou o quê? O que eu te falei. Um algo mais. Um pouquinho mais de cada um, não digo no sentido técnico, mas de coração mesmo”

PERFIL DO ZÉ MARCO

NOME: José Marco Rodrigues
IDADE: 28 anos
NATURAL: Rolim de Moura – RO
POSIÇÃO: Volante
CLUBES: Pinheiro do Rolim de Moura (RO)
Rio Negro, Nacional, Grêmio Coariense (AM), Irati (PR),
Rio Branco (AC), Campinense (PB), Futebol italiano – Segunda Divisão 2002.

Fac símile do jornal O Rio Branco de 03 de setembro de 2009