Dois cracaços!

Um dia desses do infinito tempo, num desses lugares do espaço por onde eu passei ultimamente, vi um cartaz conclamando jovens a entrarem numa escola de atores para se iniciarem nas artes da representação. A frase que sintetizava o apelo era a seguinte: “Venha aprender a viver várias vidas”.

Aí, um pouco depois, eu tive a prova dessa vivência de múltiplas vidas ao assistir, numa mesma semana, dois filmes da recente produção brasileira: “Marighella”, de Wagner Moura, e “Pixinguinha – Um homem carinhoso”, de Denise Saraceni, ambos tendo como protagonista o ator Seu Jorge.

Ali, na sala escura de projeção, num espaço de dois dias de diferença, eu vi o ator/cantor Seu Jorge se transmutar nos papeis de guerrilheiro em luta contra uma cruel e sanguinária ditadura militar, fato da história política do Brasil, e de virtuose da música nativa, que influenciou gerações de músicos.

No que diz respeito a Marighella, cujo prenome era Carlos, resumindo, pra quem por acaso esteja alheio da história recente destes trópicos, ele foi considerado pelos milicos brasileiros, na década de 1960, o “inimigo número um do país”. E, por isso, foi executado numa rua de São Paulo, em 1969.

Baiano de Salvador, nascido no dia 5 de dezembro de 1911, deputado federal na segunda metade da década de 1940, Carlos Marighella se insurgiu contra o regime de força instalado no Brasil em 1964, ajudando a criar uma organização de combate ao poder intitulada Ação Libertadora Nacional.

Quanto ao Pixinguinha (Alfredo da Rocha Vianna Filho), que nasceu no Rio de Janeiro, no dia 23 de abril de 1897, ele foi provavelmente o músico mais famoso do seu tempo, fazendo sucesso, inclusive, na capital da França, empolgando os europeus com ritmos como o choro, o samba e a valsa.

Pixinguinha, cujos principais instrumentos eram a flauta e o saxofone, foi um criador compulsivo, que viveu unicamente da sua arte, agregando às suas composições elementos da música de raiz brasileira e do jazz norte-americano. Irônica (ou gloriosamente), ele morreu dentro de uma catedral.

Marighella e Pixinguinha, nas suas respectivas atividades, ainda que tão díspares, foram dois cracaços da história recente do Brasil. Felizmente, por iniciativa de Wagner Moura e Denise Saraceni, eles voltam na sua plenitude para o conhecimento e a lembrança das novas e velhas gerações.

Sim, “pra não dizer que eu não falei de flores” (propositadamente citando Geraldo Vandré), levando em conta que essas mal traçadas aqui deveriam falar de esportes, não custa lembrar que o Atlético Mineiro fechou o ano com uma tríplice coroa. O Galo vencedor canta alto nas Alterosas!