Francisco Dandão
Não é possível ao ser humano viver sem fantasias. A parte dura da vida, os perigos de cada esquina, as desilusões cotidianas, as esperanças frustradas, as decepções (incluindo aqui nesse quesito aquela derrota do time do coração), tudo isso pode ser compensado por uma boa dose de fantasias.
As fantasias podem ser realizadas a qualquer momento. Mas no carnaval, período em que (quase) tudo é permitido, às claras, no calor das avenidas, é que elas (as fantasias) afloram com mais força. Tem gente que solta a franga, tem gente que escancara e tem gente que bota o bloco na rua.
Dos carnavais do passado, eu lembro de jogadores de futebol (tanto faz se famosos ou não) que costumavam se vestir de mulher. Não sei se era algum desejo escondido de se travestir como o belo sexo, ou se era só por escracho mesmo. Mas o certo é que os caras botavam até o sutiã das patroas.
Era tradicional, inclusive, a realização de uma pelada onde os atletas iam todos vestidos com trajes femininos. Tinha pouco jogo, é verdade. A bola é o que menos interessava. O que havia era mais álcool do que bola envolvido na disputa. E tome trombadas, quedas e muitas gargalhadas.
Um detalhe significativo na indumentária dos peladeiros foliões era o sapato, quase sempre de salto altíssimo. Difícil correr de salto alto. Mas, pra falar a verdade, alguns dos caras já usavam no dia a dia chuteiras de salto assim mais elevado do que o normal. De alguns se dizia “enganadores”.
O uso da cachaça, igualmente à fantasia de mulher, apenas ficava mais evidente no carnaval. Os caras já tomavam todas durante o ano. Só davam um jeito de ser mais discretos, ingerindo “na moita”, nos fundos dos botecos, longe das vistas da galera. No carnaval era tempo de tomar abertamente.
E no delírio que se seguia, não era raro os que adormeciam sob o efeito da “marvada” e que sonhavam marcando gols dos mais requintados feitios. No dia seguinte, é claro, só restava uma terrível dor de cabeça e um gosto de guarda-chuva na boca. Aí, para curar, o recomendado era tomar outro porre.
Parece que esses costumes estão mudando. Tá tudo muito perigoso nos tempos que correm. Tem ladrão pra todo canto. Sem falar nas patrulhas ideológicas. Agora, o jogador que se vestir de mulher e tomar umas e outras no carnaval pode ser assaltado no campo da pelada ou cair na língua do povo.
Naturalmente, tem ainda ex-jogador que não abre mão de uma boa fantasia durante o carnaval. O Joraí, zagueiro que mais gols contra marcou na história do Acre, é um desses. Ele vai sair de Zorro (devido a máscara), de pirata (por causa da perna de pau) e de odalisca (sem explicação). Bidu!