Um dia desses eu publiquei uma foto histórica do futebol acreano numa rede social. Na foto aparecem três personagens: os irmãos laterais Chico e Zé Alab e, no meio dos dois, ninguém menos do que o gênio Garrincha, aquele das pernas tortas que brilhou no Botafogo e na seleção.
A foto foi tirada em 1973, quando Garrincha não jogava mais profissionalmente. O cracaço, que deslumbrou o mundo e ajudou o Brasil a ser campeão das Copas de 1958, na Suécia, e 1962, no Chile, havia parado de jogar no ano anterior, vestindo a camisa do modesto Olaria carioca.
Àquela altura, Garrincha, com problemas em um dos joelhos, dadas as muitas pancadas que recebeu dos adversários, se ocupava em fazer amistosos pelo interior do país. E, apesar das limitações físicas, que não o deixavam mais jogar o fino da bola, arrastava multidões onde quer que se apresentasse.
No Acre ele fez dois jogos, sempre atuando um tempo com a camisa de cada um dos times contendores. Um dos jogos foi o mostrado na foto que eu postei, entre Independência e Atlético. O outro jogo confrontou o Rio Branco e o Juventus. Em ambos, o Estádio José de Melo abarrotou de gente.
É nesse “abarrotou de gente” que eu queria chegar. Testemunhas da época durante muitos anos deram conta de que as bilheterias anunciadas para ambos os jogos nem de longe refletiram o tanto de pessoas que se aglomeraram para ver as exibições do Garrincha. Muita gente e pouca grana.
Aí surgiram várias teses para explicar a “evasão de divisas”. A mais aceita de todas essas teses explicava que a causa de tão pouca renda registrada nas bilheterias foi a entrada de dezenas de torcedores de forma pouco convencional, por fora dos portões. Muita gente “furou o jogo”.
Naquela época havia inúmeras formas de assistir jogos no Estádio José de Melo sem pagar para fazê-lo. No lado do muro que dava (dá até hoje) para o bairro da Capoeira, por exemplo, todas (ou quase) as casas tinham uma arquibancada no fundo do quintal. O muro baixo era que permitia isso.
E quem não tinha um amigo dono de uma dessas arquibancadas clandestinas ou chegava atrasado e não conseguia espaço nas ditas cujas, o jeito era apelar para o instituto do “furar o jogo”. Aí valia tudo, desde pular o muro até descobrir algum buraco para passar por dentro do tal obstáculo.
Sobre buracos, aliás, a coisa era tão séria que existiam espertalhões que cobravam ingresso para deixar a galera “furar” por lá. Naturalmente, era um “ingresso” a preço bem baixo. Pelo lado do bairro do Ipase tinha um desses “portões” clandestinos. E por ali passou muita gente boa. Passou sim.