Alemanha. O nome causa arrepios no torcedor brasileiro desde o fatídico 7 a 1 de 2014. Para um jogador em especial, porém, a Alemanha significa a maior oportunidade da vida, a redenção e a entrada para um seleto grupo de heróis nacional. Aos 28 anos, Weverton Pereira da Silva ajudou o Brasil na conquista do inédito ouro olímpico e (um pouco) na recuperação da autoestima. Como prêmio, o camisa 1 olímpico agora também é da seleção principal.
Em um bate-papo descontraído, o goleiro do Atlético Paranaense contou que a vida já mudou bastante na última semana e revela detalhes dos bastidores do time que superou críticas após empatar com África do Sul e Iraque e ganhou uma Olimpíada pela primeira vez para o Brasil no futebol.
“Até não víamos muita TV, mas todo mundo tem telefone e hoje tem tudo pela internet. Foi algo que nos deixou triste, por que a gente não vinha jogando mal, só não tinha feito gol.”
Leia abaixo a íntegra da entrevista com o goleiro:
Weverton, a vida já mudou nesses dias?
Weverton – Ô, mudou muito, só não mudou a conta bancária, mas já mudou bastante (risos). As pessoas hoje me reconhecem muito mais. Na saída do Rio muita gente veio falar comigo. Eu antes contava que ia treinar e só gritavam pro Neymar. Depois do título, gritaram meu nome, eu olhei pra trás e até pensei, “mas é comigo mesmo?” (risos)
Você publicou no seu Instagram uma fotomontagem com você mesmo há 13 anos, ainda começando a carreira e dizendo “acredite sempre”. Como foi esse reencontro com você mesmo?
Muita coisa que passa na cabeça. Há 13 anos, eu no Acre, nem sonhava na verdade em estar onde eu estou hoje. Foi uma pessoa, um fã, que fez essa foto no Instagram e eu até pedi pra ele, vou fazer um quadro, colocando a medalha. Foi um momento de felicidade, de estar de parabéns por toda aquela luta. Foi motivo de orgulho e de agradecer a Deus. A gente vê muita gente boa, com talento, mas que não tem oportunidade de mostrar, e pra mim isso abriu no momento certo.
E agora você já é também um goleiro de seleção principal. Como foi receber mais essa notícia?
Dessa vez eu estava no Atlético treinando, e quando eu estava subindo para o campo todo mundo veio dar parabéns, veio festejar comigo a convocação. Fiquei muito feliz, tem o reconhecimento do trabalho. A oportunidade da seleção olímpica ajudou.
Você foi o titular da seleção olímpica sendo acima dos 23, outros podiam ter ido, mas foi você. Só que o Marcelo Grohe e o Alisson têm mais experiência em seleção. Acha que vai ser o titular?
É uma questão que o Tite e o Taffarel vão resolver. Mas eu me sinto bem e preparado, confiante. Já muito mais maduro e relaxado, conhecendo o ambiente de seleção. A cobrança é igual na Olímpica, por ser Brasil, por um titulo que o Brasil nunca teve. Deu pra sentir a pressão. Hoje, depois desse ouro, tenho mais tranquilidade e, se eu puder jogar, vou fazer o melhor. Senão, eu vou esperar.
Você falou em pressão. Depois daqueles dois primeiros jogos, até o Galvão Bueno pegou firme com vocês. Ele, o Milton Neves… o que chegou até vocês?
Realmente, a gente acaba vendo algumas coisas, é inevitável. Até não víamos muita TV, mas todo mundo tem telefone e hoje tem tudo pela internet. Foi algo que nos deixou triste, por que a gente não vinha jogando mal, só não tinha feito gol. A bola mal chegou no meu gol naqueles jogos e lá na frente a bola não queria entrar.
É natural ter essa cobrança, o futebol brasileiro não vinha bem desde a Copa, depois veio a eliminação na Copa América, a seleção não estava com tanta credibilidade E a gente começou não muito bem contra dois times não tradicionais.
Só que não tem mais time bobo, tem que jogar. E uma final Brasil x Alemanha criou um clima de revanche e a gente deu a resposta para o torcedor ao ser campeão olímpico. E agora com o Tite, que foi unanimidade no posto, temos tudo pra crescer e voltar ao topo do mundo.
Mas sobre essa pressão da imprensa, pesada, vocês chegaram a falar internamente?
Não falamos sobre isso assim não, falamos sim em mudar a situação. Apesar de jogar bem, tinha que ter algo a mais. A gente sabe como funciona o futebol. Joga mal fala mal, joga bem fala bem, a opinião é conforme as derrotas. Galvão, Milton, Neto, falaram mal no começo, mas depois deram os méritos.
E aí teve o “medalhaço” no Instagram do Neto…
Teve, acho que da mesma forma que ele tem o direito de falar o que pensa, os jogadores também têm. Quando ele viu o time mal, ele falou o que pensava, todo mundo ouviu e foi trabalhar. Aí quando ganhamos fomos lá falar com ele também.
E teve também as comparações com a seleção feminina. Incomodou?
Acho que o futebol brasileiro não vinha num momento bom, muita coisa acontecendo. Vimos as meninas ganhando de todo mundo, jogando bem, fizeram uma grande primeira fase. Eu vejo essa comparação mais como uma provocação. E acabou ajudando, a gente quis dar a voltar por cima, aquela geração queria sair por cima.
Mas a comparação não vem ao caso, elas são elas, nós somos nós. E nós acompanhamos e torcemos muito por elas, infelizmente não aconteceu, mas quem sabe na próxima elas vão trazer esse ouro pra gente.
Por falar em festa, você viu o vídeo dos dois torcedores do Coritiba que não comemoraram a sua defesa do pênalti?
(Risos) Vi, incrível! Vi ontem, até deixei um comentário. Disse que eu era brasileiro com orgulho e amor, independente de qualquer coisa. Mas a graça do futebol é essa, se for tudo amiguinho, bonitinho, não tem graça. Só que com a seleção, independentemente de qualquer coisa. Eu respeito os dois, a vida é deles, mas eles mostraram que em primeiro lugar está o clube e depois a seleção, paciência. Dei risada, nunca tinha visto nada assim.
Por falar no seu clube, o Atlético passou uma pequena revolução enquanto você esteve fora (Walter e Vinicius foram para o Goiás e Náutico, respectivamente, e o clube contratou Luan, do Palmeiras).
Passou, realmente. As coisas mudaram um pouco. Infelizmente não cabe a mim resolver, a diretoria está se mexendo para ver o que faz de melhor e eu tenho que trabalhar. Espero que nessa volta
Foi depois de um grande jogo pelo Atlético conta o Cruzeiro (3 x 0, em BH) que você foi lembrado. Acha que aquele jogo garantiu a sua convocação?
Então, foi um jogo muito bom, tecnicamente a equipe foi bem. E dei a felicidade deles [Tite e Rogério Micale] estarem observando. Acredito que se ele não foi lá para me ver, acabou me vendo.
Quis o destino que você tomasse um gol apenas na Olimpíada para depois ser decisivo nos pênaltis. Hoje você é visto como pegador de pênaltis, mas lá atrás chegou a ser substituído nas cobranças em uma eliminatória da base do Corinthians na Copa São Paulo. O que mudou de lá para cá?
Realmente no passado teve esse episódio na Copinha. Era algo que eu não me importava, eu achava que pênalti era acaso, que podia acontecer de pegar ou não. Fui deixando passar, não trabalhei isso e aquela vez acabei trocado. Quando eu cheguei no Atlético, não conseguia pegar pênalti. Até o dia em que o Luciano de Oliveira, meu treinador, falou “vamos mudar essa história”, me chamou pra conversar e mostrou um plano pra mim.
Treinamos bastante a ideia que ele me passou e acabou dando certo. Ano passando peguei três seguidos, depois outro na Sul-Americana e esse ano peguei o pênalti mais importante da minha vida. Agradeço a ele por ter se importado com isso, me tornei um dos grandes pegadores de pênalti do
Brasil.
Acabou o jogo, você pegou a bola e colocou embaixo da barriga. Vai ser papai?
(Risos), Cara, eu vou ser pai de uma menina, a Valentina, ela nasce em final de dezembro e foi sim uma homenagem a ela, mas também para esconder a bola! Eu queria levar a bola embora e a Fifa não deixa, acho que eles levam para leiloar e tal. Pensei: “vou por aqui e ninguém me toma mais!” Aí eu trouxe pra casa, já botei no vidro e está aqui em casa com a medalha! (risos)
E o futuro?
Ah, eu tenho contrato com o Atlético até o maio de 2018. O futuro não dá nem pra se planejar, depois do que aconteceu… Deus surpreende a gente. É ter tranquilidade, continuar aqui. Como todo jogador, eu tenho um desejo se jogar fora do país, se tiver oportunidade.
E trocar de clube no Brasil?
Pergunta difícil… aquilo que for bom para o Atlético e for bom para mim, vai ser feito. É natural no futebol. Mas eu estou muito feliz mesmo, tenho um carinho muito grande pelo clube, me identifico com a camisa.
Você entrou para a história da seleção e do Atlético, que já tinha o Kléberson no time do penta. Falaram disso por aí?
Sabe que o Kléberson me ligou, me deu os parabéns pelo feito. A gente aqui tinha o penta e agora tem o ouro né, marcamos história para a seleção e para o nosso clube.
Napoleão de Almeida
Colaboração para o UOL Esporte, em Curitiba