Ando me deliciando por esses dias com a leitura de um livrinho (porque de poucas páginas e não por algum juízo de valor) de crônicas intitulado “Ode a Mauro Shampoo e outras histórias da várzea”, de autoria do escritor/professor/pesquisador/filósofo e muito mais Luiz Antonio Simas.
A “várzea”, como todo mundo sabe (ou deveria saber), de acordo com os melhores dicionários do gênero (ou pelos ensinamentos do santo Google, que agora ninguém mais se dá ao trabalho de manusear folhas de papel), é uma extensão de terra plana, com certa frequência às margens dos rios.
Para efeitos do jargão futebolístico, porém, a várzea é qualquer terreno baldio, de preferência onde não existe grama, onde cabeças-de-bagre de toda a espécie batem a sua bolinha nos finais de semana. Sim, claro, cabeças-de-bagre formam a maioria, mas eventualmente também alguém bom de bola.
É no futebol de várzea, aliás, que se pode encontrar as melhores histórias. Aqueles relatos que não vão sair nos jornais, muito menos na televisão, mas que vão atravessar a semana seguinte aos “clássicos” sendo discutidos e, no mais das vezes, rendendo sonoras gargalhadas e que tais.
Voltando, porém, ao suposto fio condutor dessas mal traçadas de hoje, que é o livro do Luiz Antonio Simas, veja-se que o “herói” que empresta seu nome ao título (o Mauro Shampoo), foi centroavante do pernambucano Íbis, time tido e havido como o pior do mundo, como atestam as estatísticas.
O Mauro Shampoo, segundo o hilariante relato do Luiz Antonio, nos dez anos que comandou o ataque do Íbis jamais saiu de campo com uma vitória. Nem umazinha. Foi peia pra caramba. E mais ainda: nesses mesmos dez anos, Shampoo, que também era cabeleireiro, marcou apenas um gol.
Este gol único do “craque” Shampoo, de acordo com o autor do livro, causou uma alegria tão intensa que “fez a comemoração do gol de Jairzinho, no lendário Brasil e Inglaterra da Copa de 1970, parecer algo tão vibrante quanto uma procissão de Corpus Christi no interior de Minas Gerais.” Kkk.
Mas o Shampoo é apenas o primeiro personagem do Simas. A escalação do Vila de Cava de Nova Iguaçu é impagável. A saber: Elizângela; Camunga, Carlinhos Nem Fudendo, Mão Branca e Tornado; Jorge Macaco, Capiroto e Corno Manso; Curupira, Abecedário e Aderaldo Miquimba.
Pode isso, Arnaldo? Sei não. O que eu sei é que os campos de várzea estão cada vez mais rareando, mediante uma gama de fatores, entre os quais a especulação imobiliária predatória e a ganância das construtoras. Noves fora tudo isso, pelo menos há quem eternize a várzea em forma de literatura!