Envolvido no lançamento do livro sobre heráldica futebolística, os distintivos dos clubes, que escrevera com o saudoso amigo Luiz Fernando Bindi, eram meados de 2011 quando me encontrei com aquele rapaz, de nome Amarildo, em um pequeno shopping na capital amazonense.
Carregava consigo uma sacola meio amarrotada, com uma bela camisa esmeraldina, e tão logo sentou se à mesa já antecipou “desculpe-me pelo atraso, mas estou no meio do horário de almoço do meu trabalho e não podia deixar de ve-lo”. Lisonjeado por certo reconhecimento do qual não sou merecedor, sua fala era empolgada e tinha motivos para tal, acabara de fundar o Esporte Clube Iranduba da Amazônia.
Cidade localizada ao lado da capital baré, ainda que do outro lado do Rio Negro, Iranduba, cujo nome em tupi-guarani significa “lugar com muitas abelhas”, talvez tenha sido a grande beneficiada pela construção da ponte estaiada, de quase 4 quilômetros de extensão, que a ligou à Manaus. Em meio de muitas polêmicas, sobretudo por conta do alto custo, a ponte Rio Negro mudou a paisagem da região.
Com voz grave e forte, Amarildo, que atuara anos antes em um clube local, o São Raimundo, tricampeão da região norte nos anos 1990, não conseguia se conter ao falar de seus planos para a equipe alviverde que dentro de alguns dias iria estrear no campeonato amazonense da segunda divisão: “Vamos subir e ano que vem estaremos no Barezão (como é chamada a competição local)”, dizia ele. Entre tantos assuntos, logo veio à tona, aquele que fazia brilhar, ainda mais, seus olhos, o time feminino que também faria sua estreia no campeonato estadual naquele ano.
Diante de tantos sonhos, não pude me furtar a, dentro da minha reduzida rede de contatos, tentar algum tipo de divulgação em terras bandeirantes. Indiquei o nome de um jornalista que atuava na época em uma rádio na capital paulista. Ao contata-lo, Amarildo logo levou uma ‘flechada’: “…a simples criação de um clube não é uma pauta tão interessante, lamento”. Antes que o jornalista concluísse, antecipou “… mas pretendo plantar uma muda, em meio da floresta amazônica, alusivo a cada espectador dos jogos da equipe…”. Pois é, a flechada fora devolvida e, pela primeira vez o nome do Esporte Clube Iranduba era falado em uma rádio de expressão nacional. Em meio de uma competição cujo público não passara de dezenas de curiosos, não foi difícil cumprir a promessa das mudas.
Em campo, as coisas pareciam mais fáceis, ainda que não fossem. Apesar disso e diante tantas dificuldades, o time masculino conquistou o acesso para a primeira divisão do estadual e o feminino levantou a taça, a primeira do futebol profissional do clube. No ano seguinte, 2012, os feitos foram ainda maiores, o vice-campeonato do segundo turno do estadual no masculino e o bicampeonato feminino. E aí não parou mais. Ainda que distante foi impressionante acompanhar o progresso do clube amazonense. Tantos abnegados, apaixonados, profissionais e atletas que estão transformando, tomara que para sempre, a história do futebol feminino e amazonense. Certamente o esporte local jamais será o mesmo a partir dos feitos do Iranduba.
Quase 6 anos depois, em nosso mais recente encontro, também em um shopping, desta vez na capital paulista, dividi a mesa com o mesmo Amarildo, presidente, agora, de um clube hexacampeão estadual, semifinalista do campeonato brasileiro de futebol feminino, que eliminara o, até então, atual campeão da competição, o Flamengo, e que levara mais de 25 mil pessoas para uma partida de futebol feminino, três vezes o maior público do campeonato estadual masculino, e novo recorde brasileiro na categoria, na Arena da Amazônia, um dos palcos da Copa do Mundo de 2014, e já figurinha carimbada da grande mídia nacional sob a alcunha de ‘Hulk da Amazônia’. No futsal, a equipe feminina já fora bicampeã amazonense sub-20 e campeã adulta. O mundo realmente nos presenteia com oportunidades únicas para sermos testemunhas de fatos épicos.
Parabéns Iranduba e todos seus atletas, profissionais e torcedores que têm contribuído com esta história de sucesso.