Passe de “tacón”

Até antes da minha mais recente viagem à Europa, entre 22 de setembro e 4 de outubro, eu não tinha noção do que era um passe de “tacón”. Apesar dos quase cinquenta anos de janela, seja no campo, como juvenil, ou fora dele, como cronista, eu e o “tacón” não nos conhecíamos.

O “tacón” e eu fomos apresentados formalmente no dia inaugural de outubro, logo na primeira vez em que eu fui a um jogo de futebol no Velho Continente. Foi a minha estreia em um estádio europeu. Embora eu já tivesse ido outras três vezes à Europa, jamais assistira a um jogo ao vivo.

O jogo em questão no qual eu fui apresentado ao até então desconhecido “tacón” foi entre o alvirrubro Sevilha e o azul celeste Alavés, pelo campeonato espanhol. Estádio cheio, torcida apaixonada, daquele tipo que canta noventa minutos sem parar. Vitória do time da casa por 2 a 1.

Por coincidência (ou capricho do destino, vai saber), fui apresentado ao “tacón” por um brasileiro. Ninguém menos do que o caboclo paraense Paulo Henrique Ganso. Isso mesmo. Quem poderia dizer que o Ganso iria me apresentar alguma coisa lá do outro lado do vasto Oceano Atlântico?

O Ganso, a propósito, deixou o São Paulo pelo Sevilha em julho. Foi contratado pelo time espanhol atendendo a um pedido do técnico argentino Jorge Sampaolli. O Sevilha pagou quase dez milhões de euros para contar com ele. Apesar de tudo isso, até hoje ele ainda não se firmou como titular.

A opinião generalizada, tanto na imprensa especializada quanto entre os torcedores sevilhanos, é a de que Ganso é craque, mas muito lento. Por isso ainda não virou titular do time do Sampaolli. Eles não conseguem entender que a bola é que deve correr, e não, necessariamente, o jogador.

Pois no sábado, primeiro de outubro, contra o Alavés, mais uma vez o Ganso começou o jogo no banco de reservas. Só entrou na metade do segundo tempo, quando tudo indicava que ninguém conseguiria movimentar o placar. O zero a zero se arrastava chato e pra lá de insólito.

E então, a um só tempo, eis que aconteceu tanto o milagre da bola, operado pelo craque rotulado de lento, quanto a apresentação do “tacón”. No meio de uma profusão de pernas adversárias, Ganso, de costas para a meta inimiga, deu um passe de calcanhar para Ben Yedder. Gol do Sevilha!

No placar eletrônico do estádio uma legenda exaltou o lance, chamando de “tacón” o calcanhar do Ganso. Estava feita a apresentação. O prazer foi todo meu. Duplo prazer: a beleza do lance e o aprendizado da expressão. Bailarina do efêmero, a bola ensaiou passos de um novo sonho!